"Xícara vazia não conta história"

Semana passada, a Cíntia, do @micajitadesuenos, trouxe à tona uma de nossas conversas antigas, onde eu falei a seguinte frase: "— Xícara vazia não conta história.". Será isso mesmo? Vem comigo pra entender!

Antes de explicar o contexto e o porquê falei a frase que deu origem a este post, quero voltar um pouco e falar um pouquinho sobre fotografia Storytelling. Talvez você ainda não saiba, mas esse é o tipo de fotos que eu mais amo fotografar. A maioria das minhas fotos são nesse estilo e isso tem tudo a ver com este post.

Fotografia Storytelling

Traduzindo ao pé da letra, Storytelling em fotografia é a arte de contar uma história por meio de uma foto. Mas calma, não é necessariamente essa história que automaticamente veio a sua cabeça, onde se tem um início, meio e fim. E não é também só aquela foto onde tem um cenário cheio de miniaturas.

Pra mim, Storytelling é uma forma conversar, interagir e mexer com a imaginação do observador. É fazer com que a pessoa, que está do outro lado, queira deduzir o que veio antes ou depois daquele clique. Storytelling em fotografia é seduzir o olhar do observador pra cada detalhe dentro da imagem, você quer evocar emoções, inspirar reações. Você dará um gostinho da história, mas o resto ficará a cargo de cada um.

Uma das coisas que mais me fascinam nesse estilo de fotografia, é a possibilidade de termos vários inícios e vários fins pra uma mesma história, afinal, cada um imaginará o restante da cena de um jeito próprio e único.

Num filme ou num livro você conduz o observador ao longo de milhares de cenas ou ao longo de vários capítulos. Numa foto você tem apenas uma única chance, logo, e mais do que nunca, é preciso ser assertivo e intencional quanto as escolhas de que caminho seguir, do contrário o objetivo não será alcançado.

Eu sei, eu sou uma apaixonada por fotografia Storytelling, e poderia ficar aqui descrevendo mil razões pra te convencer a gostar dela tanto quanto eu, mas o objetivo desse post não é falar diretamente sobre esse tipo de fotografia. Então se você quiser saber mais a respeito de Fotografia Storytelling, eu dei um aulão ao vivo a respeito só disso ano passado (06/2021) lá no Instagram da LovLoops. O vídeo continua por lá, e eu posso te garantir que é difícil encontrar conteúdo gratuito como aquele. Quem já assistiu sabe o ouro que é essa aula! Tem outras lives sobre fotografia por lá também. Então depois de ler esse post, vai lá dar uma fuçada!!

Xícara vazia não conta história

A escolha dos elementos dentro de uma fotografia é importante, independentemente do tipo de fotografia que se vá executar, afinal, tudo que você coloca dentro de uma foto tem um certo impacto visual. Em fotografia Storytelling isso tem um peso ainda maior, já que esses elementos ajudarão a dar o contexto pro observador.

Eis que chegamos ao ponto da "Xícara vazia"!

Na semana passada a Cíntia (@micajitadesuenos - um parêntese pra dizer que se você não segue ela, vale a pena seguir, ela é um ser Humano incrível e com H maiúsculo) recordou uma de nossas conversas antigas, onde discutíamos a respeito de uma foto. A foto não era minha, mas era meio no estilo dessa foto que tirei lá em maio de 2020, onde se faz uma brincadeira com "comidas" feitas de fios. A foto, lá da nossa conversa, era uma foto em ângulo de 90° (ou seja, um flatlay) de um bowl cheio de linhas fazendo vias de um yakissoba, uma mão se servindo do "yakissoba" e uma xícara vazia e limpa, de tamanho equivalente a 1/3 do bowl. Foi aí que eu soltei a frase: "— Xícara vazia não conta história" e dei algumas sugestões de como dar mais vida pra aquela imagem.

Mas será que é sempre assim? As xícaras vazias realmente não contam histórias? Eu queria poder te responder que sim, pois ficaria mais fácil né, mas a resposta mais correta é não!!! Xícaras vazias também contam histórias.

Dito isso, vamos analisar primeiramente essa foto do "prato de macarrão". Imagine essa mesma foto, porém agora com as taças vazias. É certo que você ainda entenderia que é uma mesa, mas você deixaria por conta do observador imaginar o que teria dentro dos objetos vazios. Essa estratégia funciona em alguns casos, mas no exemplo, as taças são objetos secundários, logo não queremos que o observador perca muitos segundos imaginando o que poderia ter nas taças, queremos que ele passe o olho rápido por ali e se concentre nos objetos principais, que no caso são o René Jacaré e o "prato de macarrão".

Agora voltemos para a foto da conversa que descrevi ali em cima. A ideia era mostrar uma refeição acontecendo naquele exato momento, assim como no caso da minha foto com o René. A mão se servindo do macarrão dava vida pra essa história, porém a xícara vazia naquela foto não contava nada. Era como se ela não pertencesse àquela cena, já que estava vazia e limpa, nada acontecia por ali. Além disso, a xícara tinha o tamanho de 1/3 do bowl, e competia visualmente pelo olhar do observador. Para esta cena ficar mais convidativa para o observador, aquela xícara precisava estar com alguma coisa dentro, nem que fosse só o fundinho, dando o ar de que a bebida que estava ali acabou antes mesmo da refeição chegar.

Em Storytelling, cada elemento importa e a forma com que ele se encontra na foto pode contar coisas diferentes ou simplesmente não contar nada. Observe as três fotos abaixo e antes de seguir a leitura, analise qual história você contaria pra cada uma dessas fotos.

Você contou a mesma história para todas elas? Eu tenho certeza que não!

A xícara cheia não contará a mesma história que uma xícara onde o chá já foi tomado. São momentos diferentes, logo nos levam a pensar coisas diferentes também.

E agora me conta, que história você contou para a última foto, a da xícara vazia e limpa? É mais difícil criar uma história para ela né! Se nessa foto aparecesse um bule, ou uma mão abrindo um pacotinho de chá, ficaria mais fácil conectar a xícara vazia e limpa para dentro da cena, certo? Ela desse jeito, acaba não contando história nenhuma, apenas compete visualmente pelo olhar do observador.

Quer dizer então que eu nunca posso usar xícaras vazias e limpas, Jeni? Veja bem, não!

Pense comigo, e se fosse uma foto de mesa posta. Ninguém se serviu ainda, logo as coisas vão estar todas limpas, vazias e organizadas. Agora imagine uma cena de alguém abrindo um pacote de presente, e imagine que este presente é uma xícara (aliás eu amo ganhar xícaras!!!). Não faria sentido algum uma xícara cheia ou suja em nenhum desses contextos, certo?

Preciso acrescentar que estamos aqui falando em louças, mas o conceito de cheio e vazio pode ser levado pra qualquer coisa, um novelo recém-aberto e um novelo acabando, um crochê no anel mágico e uma bolinha feita, 10 bolachas num pote ou apenas uma e por aí vai... Eu gosto sempre de falar que em fotografia existe INTENÇÃO e CONTEXTO. No fim não importa se a xícara está vazia ou cheia, ambas contam histórias, mas dependendo da intenção e do contexto que se quer dar para a foto é melhor optar por um ou outro caminho.

Percebeu como tudo em uma fotografia têm poder?

Existe um mundo por trás da fotografia Storytelling, mas por hoje já falei muita coisa, nem sei se você aguentou chegar até aqui.

Agora eu te faço um convite. Vá no Pinterest, escolha 2 ou 3 fotos da sua página inicial e imagine as histórias pras fotos que está vendo. Perceba se você consegue contar uma história ou não. Tente também identificar qual é o objeto principal da foto e se você considera que tem algo ali em excesso. Essa é uma maneira bacana de expandir nosso repertório e treinar o olhar!

“O treino do olhar é um exercício diário. Você não perderá nem 5 min fazendo o exercício. Então vai lá treinar, sem desculpas!!!”

Um abraço, Jeni ♥️

Nos vemos no próximo post!